domingo, fevereiro 18, 2018

Experiências em casas diferentes, que aos poucos também vão sendo nossas

A primeira e única vez que me lembro de ter ido a um Lar, devia ter os meus nove ou dez anos. Era em Salvaterra de Magos, tinha um papagaio, e à volta havia muito campo, por onde eu e a minha prima Sónia nos fartámos de correr e brincar. Tínhamos ido ver a minha tia-avó Emília. 
E foi isso. De resto, todos os meus avós estavam longe, em Viana, e a sua partida, quer tenha sido mais ou menos de repente ou de forma arrastada no tempo, foi acompanhada por mim de forma um tanto ou quanto distante. Vi-os envelhecer, mas aos pouquinhos, e com a perspetiva de quem sempre os tinha achado velhos, mas não os vi com o raciocínio meio desmantelado e não pude acompanhar de perto o acabar dependente da doença. 

Acompanho este definhar da minha mãe e percebo que toda a noção de velhice para os meus filhos será diferente. Há cinco meses que rumam semanalmente para o Lar onde se tornou inevitável colocá-la e, ali, à sua volta, vão criando os seus conceitos de velhice. 
Há tardes em que pouco estão com a avó. Correm lá fora, no pátio circundante, jogam à bola e às escondidas. Não me faz mossa, quero mesmo é que eles gostem de lá ir. Há tardes em que brincam no quarto, descalços, usando a cama da vizinha da avó, que nunca está e que nos garantiram que não se importaria. Sei que correm por lá de forma cada vez mais conhecedora, vão buscar rebuçados ao escritório das proprietárias e falam mais alto do que provavelmente deveriam.

Não sei se lhes faz confusão os olhares vazios de alguns idosos, ou a quietude, ou o deambular de outros. Quase não comentam o ambiente, e aceitam-no com naturalidade, mesmo nos dias em que dão entrada senhores com demência, perdidos no tempo, zangados com o mundo. Espantam-se primeiro, riem-se depois, meio à socapa. No outro dia, a uma senhora angustiada e aflita, a chamar incessantemente pelo filho e a dizer que tinha ali ido «ao engano», a Joana fez uma festinha, na mão... (Eu morri de orgulho, com a capacidade de empatia...)
 
E depois, há momentos que são pérolas e que eu espero -  espero tanto! - que lhes fiquem marcados naquela assoalhada que guardamos no cérebro para as lembranças única e exclusivamente boas. Como o de ontem, em que as miúdas brincavam sentadas a uma mesa, com bonecos de lego, e chegou a D. Idalina, amorosa, e meteu conversa, contou histórias antigas, sentou-se. E eu ouvia as duas a responder-lhe. 12, 04 e 94 anos. Uma bela conversa. 



Rita

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