Estava a vestir um casaco de malha às riscas e a congratular-me por ainda lhe servir, quando a ouço:
- Não gosto deste casaco.
Fiquei surpreendida e fiz o que faço sempre, converso sobre o assunto, tentando convencê-la:
- Não gostas? A sério?! É tão lindo, tão colorido... Era do mano, sabes, foi a avó que lhe ofereceu quando ele era pequeno.
Instantaneamente, ela torna a vestir o que do casaco já começara a despir:
- Ah, então gosto.
Foi uma mudança tão rápida numa pessoinha tão tendencialmente assertiva (e oposicionista...!) nestas coisas, que eu até estranhei. Até que a ouço:
- Sabes porquê...? Porque eu gosto muito da avó, ela é muito querida...
Diga-se, para quem precisa, que quando ela nasceu, há quase cinco anos, já a avó estava doente. Enquanto bebé, sempre lhe pegou ao colo sentada, para que não se arriscasse mais uma queda inexplicável e de surpresa, naquela altura a serem cada vez mais habituais... Não me recordo de terem conversado muito as duas, porque a avó falava cada vez menos e mais baixo e as crianças pequenas não são conhecidas pela paciência... e é impossível que, com a idade que tem, ela se vá recordar de muito mais do que aquela avó, no Lar, que quase não se mexe, sem expressão, a quem ela dá um beijinho, faz umas festas na cara ou segura na mão. Ou aproveita o quarto e a cama para brincar e jogar, segundo as minhas tentativas de que a avó lhe vá apreendendo o feitio, o crescimento, desta forma tão básica que atualmente lhe é permitido... O célebre "melhor que nada"...
Fico enternecida com as palavras dela... agradável e ao mesmo tempo tristemente enternecida... mas sorrio de mim para comigo... não é um riso fácil e descontraído como daquela vez em que, no Lar, depois de aconchegarmos as almofadas e roupa de cama à volta da minha mãe, a vejo entrelaçar os dedos das mãos uns nos outros e dizer: «Oh, tão querida... Parece um animalzinho do bosque...!»... mas é, em todo o caso, um sorriso.
Rita